Re: Toxicodependência - Despenalização e legalização das drogas
Data: 27 de January de 2005 20:30
O enunciado destas temáticas de enquadramento legal do consumo de
estupefacientes, tal como tem vindo a ser debatido, assenta em pressupostos que
merecem uma necessária e aprofundada ponderação (por compreensíveis razões
de brevidade, ficam aqui apenas alguns elementos).
Desde logo, o conceito de "separação" das chamadas "drogas leves", com
uma perspectiva de difícil avaliação quanto aos seus impactos na saúde
pública e no próprio consumo de drogas. Mesmo em países onde esse passo foi
dado em determinados momentos, a tendência actual é de recuo: por exemplo, o
famoso caso da Holanda, com a particularidade de aquele país ter, no seu
ordenamento jurídico e constitucional, uma flexibilidade para alterações e
correcções no plano legal que a nossa Constituição não permite. De resto,
o PCP tem vindo a afirmar (e a apresentar nesse sentido propostas no
Parlamento) que se impõe acompanhar e avaliar a experiência portuguesa nesta
matéria, que, aliás, não é pouco importante. Mas a própria Estratégia
Nacional é elucidativa nesse ponto.
Foi aliás esta a posição que assumimos, alertando para a necessidade desta
reflexão, durante o debate realizado a 24 de Janeiro de 2003, no Plenário da
Assembleia da República.
Por outro lado, sobre as chamadas "salas de chuto", é de recordar que o
enquadramento legal português não é contraditório nem conflitual com o
conceito. O que tem surgido do debate até agora desenvolvido, inclusive em
termos técnicos, levanta a questão da oportunidade da aplicação em concreto
dessa medida. Particularmente quando há vertentes prioritárias de
intervenção no tratamento e na redução de danos - aspecto abordado noutro
tópico - que têm sido menosprezadas pelo Poder Central. O que é preciso
sublinhar é que o humanismo e o pragmatismo têm de estar na base destas
políticas, e não o preconceito de nenhum tipo.
Entretanto, a este propósito, importa afirmar com clareza que a evolução
registada na legislação do nosso país, no passado recente, teve a marca, o
contributo e a proposta dos eleitos da CDU. É assim que podemos hoje dizer que
foi em larga medida com a nossa contribuição que se consagrou, no quadro da
legislação portuguesa, o princípio de que o toxicodependente é um doente e
não um criminoso - ou seja, consagrou-se a descriminalização do consumo de
drogas. Isto passou-se num momento em que a Direita estava em minoria na
Assembleia da República, o que pode ser um exemplo da postura da CDU, força
política consequente, responsável e construtiva, que não tem complexos em
contribuir para medidas positivas, assim como não hesita em dar combate a
medidas negativas. A vida aí está para o demonstrar.
Bruno Dias,
Membro do Grupo Parlamentar e do Comité Central do PCP